domingo, 30 de março de 2014

Futebol e resistência cultura no primeiro governo Vargas

  Na Copa de 1938, o futebol adquiriu uma popularidade jamais vista até então. Todos os jornais divulgaram o acontecimento. Transmissões ao vivo dos jogos foram feitas pelos rádios. Bancos e comércios promoveram campanhas de donativos aos jogadores. 
  No Brasil, o futebol se tornou em esporte nacional, não apenas por ser o mais praticado, mas, principalmente, porque durante as Copas do Mundo uma série de representações sobre a nação e o povo brasileiro se legitimam a partir do futebol. Nesta época, vive-se a experiência da identificação nacional, onde poucas pessoas conseguem escapar. Criam-se e recriam-se várias concepções de Brasil, bem como de alguns heróis e vilões.
  O Estado brasileiro, que se consolidou após 1930, não ficou passível diante deste fenômeno. Para o novo governo, era fundamental a retomada da construção da identidade nacional, articulando a comunicação entre as elites e a massa da população (GOMES, 1994). Justificava-se, assim, a iniciativa do Estado de organizar a cultura popular como uma forma de demonstrar a tão sonhada integração social. Deste modo, os esportes e, particularmente, o futebol passaram a ser objetos das maiores atenções desde os primeiros anos do novo regime.
  O debate em torno da importância dos esportes com fins político-ideológicos, como uma forma de auto-afirmação nacional, já estava ocorrendo na Europa desde o final da Primeira Guerra Mundial em países como a Itália e a Alemanha. No período entre-guerras (1918-1939), os esportes, assim como a moderna comunicação de massa, como imprensa, cinema, rádio, foram significativos em transformar os símbolos nacionais em parte da vida dos indivíduos comuns, rompendo as divisões que existiam entre o privado e local e o público e nacional. Assim, “a imaginária comunidade de milhões parece mais real na forma de um time de onze pessoas com nome. O indivíduo, mesmo aquele que apenas torce, torna-se o próprio símbolo de sua nação” (HOBSBAWM, 1990: 171).
Portanto, o torcedor brasileiro, quando observava a seleção de futebol jogar, estava vendo um pretenso espelho da nação e, mais importante, se sentia participando dela.

  O futebol foi utilizado pelos governantes com o objetivo de construir uma ideologia de identidade nacional que busca cimentar as diferenciações sociais e unir todos no engrandecimento da nação. Mas será que essa hegemonia verde-amarela construída através do futebol foi uma construção feita somente pelo Estado e a partir de cima? Será que os outros segmentos da sociedade não participaram também dessa elaboração?
   A partir das Olimpíadas, ocorreu uma contínua e organizada intervenção do Estado nos esportes. Interferiu na polêmica no futebol entre profissionais e amadores, ajudando a selar a paz entre as entidades em 20 de julho de 1937. Ajudou o governo municipal de São Paulo na construção do Estádio do Pacaembu. E, em 1938, participou ativamente dos preparativos para a Copa do Mundo de Futebol a ser disputada na França prometendo, inclusive, “casa própria para os craques, o prêmio oferecido pelo chefe da nação se o Brasil levantar o campeonato mundial”. Antes de embarcar, Getúlio Vargas fez questão de receber a seleção e recomendou aos jogadores que voltassem como campeões mundiais, pois, o título, seria de suma importância para o futuro do país. No final, o selecionado brasileiro, fez uma bela campanha, chamou a atenção de todos na Europa e conseguiu um fantástico terceiro lugar.
  O processo de oficialização dos esportes se consolidou na criação, em 1941, do Conselho Nacional de Desportos (CND). O CND tinha as atribuições de estudar as matérias e sugerir medidas legislativas relativas à organização desportiva; além de superintender; vigiar; estimular e organizar os desportos no país. Tinha o poder de autorizar a participação de delegações nacionais em competições internacionais, de fiscalizar e proibir competições ou publicações esportivas incompatíveis com o interesse público e inclusive intervir em qualquer entidade desportiva. Ao CND também foi atribuído o poder de regulamentar os símbolos desportivos nacionais e das expressões utilizadas nos desportos. O decreto-lei também caracterizava as entidades desportivas como entidades patrióticas.
  E o que podemos constatar é que os mitos criados pelo futebol nem sempre representam o que as classes dominantes e o governo gostariam que representassem. Para restringirmos a um exemplo, na década de 1930, o jogador mais popular era Leônidas da Silva, o Diamante Negro. Para alguns, era mais popular que o próprio Getúlio Vargas. Durante a Copa do Mundo de 1938, realizado na França, Leônidas se tornou no principal jogador da seleção.
  A identidade nacional não exime as diferenças. Se o futebol foi progressivamente utilizado na década de 1930 com fins de propagar a ideologia estadonovista de uma nação de diferentes raças e classes sociais unida em torno da grandeza nacional, os trabalhadores devolviam essa concepção de identidade nacional de uma forma diversa, com a escolha de um jogador que representava uma ética mais próxima do mundo do lazer que do mundo do trabalho e da disciplina defendida pelos governantes.

Fonte: http://www.efdeportes.com/efd131/futebol-e-resistencia-cultural-no-primeiro-governo-vargas.htm
Por: Jennifer Nunes

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